terça-feira, 30 de março de 2010

Versos soltos

A grande amargura que corrói
é saber que é dado
somente aquilo que se precisa para sobreviver
e muito pouco de tudo o que faz viver.
Essa, é a grande e misteriosa dor humana:
importar-se com tanto vazio do material
e viver na angústia do desamor.
O desamor dói.
Dói como um riso não compartilhado.
É como ter tanta vida
diante de tanta morte.
Ah! Se tivessem todos tudo o que tenho!
Tanto amor para com todos que vivem,
tanta poesia para reinventar,
tanta paixão para muito arder.
Se tivessem todos, um leve tocar,
seria como viver um delírio cheio de mansidão
e para sempre serenizar.

domingo, 14 de março de 2010

Livre

Da melancolia escura que me arde
Como um livro vivo, que resplandece
Faço de toda a poesia minha prece
Calma e simples como o fim de tarde.

segunda-feira, 8 de março de 2010

Soneto de morte

E se a todos existe essa vontade
Do desesperado grito de abandono
Gritem todos nas horas de sono
Horas em que se tem mais piedade

Voltem-se todos contra a vaidade
E ao estado de se ter um dono
Serenizem nas noites de outono
E no deleito da escura eternidade

Gritem! E gritem a todos os ouvidos
Cantem à morte, cantem à vida
E cantem em gritos à fria solidão

E que assim seja a hora da partida
A doce partida, cessando a respiração
De todos os corpos nus, apodrecidos.

quarta-feira, 3 de março de 2010

Saindo de casa, cai um dilúvio. Daqueles que é bonito de assistir. Daqueles que liberam um odor muito peculiar e saboroso. E sim, ele decidiu me acompanhar durante o caminho todo. Mas era bom.
Eu estreava meu novo guarda-chuva amarelo, com personagem de desenho animado e infantil, é claro. Até perguntei para o vendedor se havia um guarda-chuva igual, porém no tamanho para adultos e realmente acho desnecessário informar a resposta.
Me senti como uma criança de novo, feliz da vida, por ter um guarda-chuva tão alegre, no meio de tantos outros pálidos e tristes. Até que observei, caminhando em minha direção, um garoto que deveria ter no máximo doze anos de idade, com um guarda-chuva cinza, triste e grande para adultos. Fiquei perplexa ao ver que o garoto não carregava um guarda-chuva alegre, ou pelo menos com personagens, afinal, a graça de ser novo, é poder se divertir com coisas assim. E pensei que realmente, se até as crianças não se divertem mais com gurda-chuvas coloridos, qual será o futuro das cores um dia?
Enfim, após pensar em todas essas coisas, passei por um ponto de ônibus e pude perceber mil cabeças torcendo o pescoço para olhar o super ultra amarelo guarda-chuva que me acompanhava. Sim, acompanhava. Porque um guarda-chuva com tanta alegria, tem quase vida própria, portanto não pode ser levado ou carregado, mas sim, me fazer companhia para todos os lugares que vou. Então, retomando, as pessoas do ponto de ônibus olharam para mim e principalmente para meu guarda-chuva que caminhava comigo, sobre mim, e olharam aquela cena com grandes olhos julgadores e certos e socialmente aceitos e completamente cheios de bom senso e sem nenhum tipo de insanidade e, com certeza, naquele momento, pude ler seus pensamentos como faz aquele bebedor de sangue do filmezinho de meninas apaixonadas. Eles variavam em: "nossa, ela tá muito velha pra isso", "pode ser bonitinho, mas é inútil, é de criança, por isso molha tudo", "essa é louca mesmo, guarda-chuva pequeno, óculos grandes e cara de lunática", "nossa, amarelo é simplesmente a coisa menos fashion que existe, não combina nenhum pouco com a roupa dela!".
E todos esses pensamentos do que eles poderiam estar pensando foram pensados por mim em um flash de exatamente 4,557658678 segundos.
Cheguei na faculdade, fechei meu companheiro e grande amigo amarelo e quando o sol subia, vi seu rosto amarelo iluminado e pensei: "Putz, tô atrasada!"